segunda-feira, junho 25, 2012

EURO 2012: o fim das identidades nacionais e a histeria anti-Alemanha

  1. Para mim, o EURO 2012 marca o culminar de um processo de descaracterização dos "futebóis" nacionais, tal como até há pouco tempo eram identificados. A Espanha já há uns anos substituiu a tradicional "fúria" pelo sonolento "tiki taki" barcelonista; Portugal pôs de parte o sacrossanto "10", a posse de bola e a herança do futebol improfícuo e sem balizas idealizado por José Maria Pedroto, um dos maiores mitos do futebol português, e foi vê-lo a jogar contra a nórdica Dinamarca em transições rápidas, bolas longas a solicitar a corrida dos alas, a intervenção do "ponta de lança" e até a marcar um golo de cabeça de um pontapé de canto; a Alemanha já se esqueceu daquele género de atletismo com bola e, ironia das ironias, vimos ontem a Itália, com a sua defesa colocada na linha de meio-campo, jogar um futebol de ataque contra uma Inglaterra encolhida numa espécie de "catenaccio". No fundo, trata-se de um processo iniciado com a emigração dos anos 60 do século passado, que fez com muitos jogadores actuais das grandes selecções sejam imigrantes de segunda geração, prosseguido com a livre circulação na UE e a lei Bosman, incluindo o intercâmbio de treinadores, e consolidado com a transformação do futebol num espectáculo televisivo global. As identidades nacionais transformaram-se em identidades de equipa, em função das ideias dos respectivos treinadores e das características dos jogadores. Não sou saudosista, e quanto a mim a competitividade aumentou e os jogos tornaram-se bem mais abertos e interessantes.
  2. Confesso estar demasiado farto dos que fazem da derrota da selecção alemã um ponto de honra, alinhando as suas preferências no EURO 2012 pela sua posição face à política europeia de Angela Merkel. Não porque seja um entusiasta dessa política (não o sou) ou alinhe pela opinião dos que separam política do desporto ou espectáculo: nunca estiveram nem estarão separados. Mas o problema é que fazer da derrota da selecção alemã - que até joga um futebol atractivo - um ponto de honra se me assemelha demasiado a um género de vingança dos impotentes, servindo de fraca compensação para a incapacidade de todos nós - portugueses, espanhóis, italianos, gregos, etc - conseguirmos fazer vingar os nossos pontos de vista políticos nos locais próprios e através dos mecanismos adequados. Acresce que a Alemanha é uma democracia e Angela Merkel a sua legítima chefe de governo, e se já assistimos por vezes a perigosas identificações entre regimes políticos e acontecimentos desportivos (o exemplo talvez mais próximo terá sido o Mundial de 78 e a ditadura argentina de Videla), não vejo onde, directa ou indirectamente, se possa associar a política europeia da Alemanha ao EURO 2012 ou à selecção alemã. Por último, a selecção alemã, com Boateng, Podolski, Klose, Özil e Kehdira, é até um bom exemplo de integração, do qual todos nós, europeus, nos devíamos orgulhar. Portanto, não contem comigo para engrossar o ruído anti-Alemanha do futebol.

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