quinta-feira, dezembro 09, 2010

Corrupção e populismo

De acordo com os números da Organização Tranparency Internacional, revelados esta quinta-feira pelos jornais Público e o Diário de Notícias, 83% dos portugueses dizem sentir que a corrupção em Portugal aumentou e piorou, e 75 por cento, ou seja, três quartos da população, pensam que o combate à corrupção exercido pelas autoridades portuguesas é ineficaz.

Não sei se a corrupção aumentou ou regrediu em Portugal nos últimos anos nem de que modo evoluiu o combate a este tipo de crime. O que sei é que este é um daqueles estudos praticamente inúteis, pois a percepção que os portugueses têm do fenómeno tem bem mais a ver com questões como a sua notoriedade nos “media”, o conhecimento ou não de alguns casos exemplares e mais mediáticos, a crise económica, a pobreza e a desigualdade, o desemprego e, por último mas não menos importante, o seu conforto ou desconforto com o regime e dirigentes políticos, do que propriamente com a evolução real do fenómeno.

Quanto à maior ou menor eficácia do combate à corrupção, para além das questões acima referidas, todos sabemos que se trata de um crime em que é normalmente difícil produzir prova em tribunal, pior ainda quando estamos a falar de casos que envolvem alto nível de sofisticação, e também sabemos quanto as questões ligadas aos direitos, liberdades e garantias são mais ou menos descartáveis para os portugueses quando se trata de julgar os “políticos” e “os ricos e poderosos”, que é realmente do que se está aqui a falar.

Voltando ao início... A corrupção aumentou ou regrediu? Não faço ideia e, dada a natureza do fenómeno, duvido alguém esteja em situação de o afirmar com rigor. Não tenho qualquer dúvida sobre o carácter pernicioso dessa mesma corrupção e sobre a necessidade de o combater sem hipocrisia e com eficácia, até porque corrupção e subdesenvolvimento costumam andar de mãos dadas. Mas o que Estado e governos não podem, de modo algum, fazer é para isso ultrapassarem os limites do Estado de Direito (ou deles “fazerem de conta”) e cederem á pressão da “rua” e da demagogia e populismo emergentes.

PS. Ouvi hoje Guilherme Oliveira Martins pedir “sanções exemplares” para crimes de corrupção. Respeito sinceramente Guilherme Oliveira Martins, mas de cada vez que oiço alguém pedir “sanções exemplares” para quaisquer tipo de crimes, fico sempre de pé atrás. Ou será que os tribunais não devem sempre julgar com isenção e independência e aplicar as leis com rigor e de acordo com a matéria provada em cada caso?

4 comentários:

Anónimo disse...

Caro JC

Mais do mesmo. Também não sei se aumentou ou diminui. Teriamos que ter dados isentos e "não corrompidos", para aferir a situação.
Mas que existe(a corrupção)e é escandalosa, existe. É mais uma vez e também uma questão cultural, sobretudo na quantidade e niveis que atinge. É uma instituição (a corrupção). É dificil de provar ? É. Mas isso não justifica que tudo fique sempre nas chamadas "águas de bacalhau". Mas alguém acredita nalguma coisa nesta sociedade tuga gerida e (des)governada pelo que de pior existe em termos de competência, corrupção, compadrio, mafiosismo ?
Isto tem tendência a acabar mal.

Cumprimentos

JC disse...

Repare: um assalto, um homícídio, um roubo são fáceis de contabilizar: os responsáveis podem ou não ser capturados, mas as evidências do crime estão lá. Na corrupção isso não acontece:podem existir desconfianças, indícios, etc, mas não existe crime se não for possível prová-lo. Mas não sou tão pessimista como você! Bem mais importante é o tráfico de influências, que é algo bem diferente.

Anónimo disse...

De acordo. A contabilização, desde que exista participação à policia, e refiro-me a roubo ou furto é sempre contabilizavél, e os números utilizados "politicamente" de acordo com o que der geito.
A corrupção é dificil de provar, para ambos os lados corruptor e corrompido. Como é que se justificam fortunas que surgem do nada ? Euromilhões ? ofertas generosas ?

joão boaventura disse...

Caro JC

O problema não está em castigar. Castigar é fácil, basta saber ler os Códigos.

O problema está que para ser corrupto é necessário proceder de acordo com o caderno de estilo, segundo o qual, para preencher os requisitos do "corrupto impecável e sem mácula", o pretendente a corrrompido tem de obedecer a todos eles.

E só os tribunais os conhecem - os requisitos, claro - como se viu no caso Sá Fernandes que, por não os seguir, não conseguiu demonstrar o perfeito corrupto.

E como a justiça, ou a lei, é cega...