terça-feira, abril 27, 2010

Greve...

Francamente, e ressalvando o facto de não conhecer “por dentro” as empresas e processos de negociação em curso, não vejo razão sólida, laboral e directa, para as greves de hoje no sector dos transportes e correios. Não me parece, para quem tenha um vínculo não provisório, os postos de trabalho possam estar em causa, quem é trabalhador precário por certo não ousa entrar em greve (ora aqui está um direito constitucional e democrático na prática negado a quem dispõe apenas de um contrato de trabalho precário) e o congelamento ou aumento salarial reduzido é compensado pela baixa inflação e queda da taxa de juro dos últimos anos – e quase todos os portugueses têm um empréstimo a amortizar. Porquê então?

Bom, existindo, com muita ou pouca razão isso é irrelevante, algum ambiente geral de descontentamento, ampliado e tornado mais visível pela democratização da informação dos últimos anos (“blogues”, comentários on line, fóruns de opinião, tabloidização dos “media”, etc), o que facilita a simpatia com que este tipo de acções é recebida pelos intervenientes mas também por terceiros, mais do que alcançar qualquer benefício directo para os trabalhadores envolvidos neste tipo de movimentações periódicas – o que dificilmente tem acontecido ou acontecerá - elas têm os seguintes e principais objectivos em vista:
  1. Manter alguma mobilização sindical e política em sectores onde o PCP e a CGTP têm alguma influência, capitalizando o descontentamento existente em seu favor. Tal como nenhum exército se pode manter demasiado tempo inactivo, o tipo de sindicalismo desenvolvido por PCP e CGTP não pode manter-se, crescer ou fortalecer-se sem este tipo de iniciativas, independentemente dos resultados alcançados.
  2. Criar dificuldades a um governo, já de si e muito por culpa própria, frágil e numa situação interna e externa muito difícil e delicada. Mais, criar também dificuldades à execução do PEC e contribuir para fragilizar o país, o euro e a UE perante os mercados e a especulação financeira.
  3. Tendo escolhido efectuar a paralização em sectores estratégicos (comunicações), onde mesmo uma pequena mobilização (e em alguns casos – CP – ela foi mesmo significativa) causaria sempre inconvenientes não negligenciáveis a uma boa parte da população e com visibilidade assegurada nos “media”, responsabilizar a política do governo por esses problemas, aumentando o já existente sentimento geral de descontentamento.

O problema para o PS - partido que apoia o governo - é ter deixado que este “programa de actividades”, que, em última análise, configura uma autêntica mobilização anti-regime, tenha transcendido as fronteiras restritas onde habitualmente se acolhia e comece a estender-se a sectores da sociedade onde era tradicionalmente rejeitado. Digamos que governo e Partido Socialista, mas também PSD e CDS, podem vir a ter aqui um problema...

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