sábado, agosto 09, 2008

Uma história de violência (IV), ou um certo "fascismo" subliminar

Existe um determinado fio condutor, o mesma lógica a unir os elogios ditirâmbicos e quase pavlovianos à actuação dos snipers da PSP no assalto ao BES de Campolide - sem sequer o vislumbre da mais pequena interrogação sobre se era a única opção possível ou qual a motivação que lhe possa estar subjacente, as suas consequências políticas e a actuação-padrão que passa a consubstanciar - e todo um outro conjunto de atitudes instaladas e tendencialmente dominantes na sociedade portuguesa: a justiça popular nas páginas e noticiários dos jornais e televisões tablóides, os assobios a Kate McCann à porta do tribunal, os pedidos de pena de morte para os pedófilos (e a tendência da sociedade portuguesa em favor da pena de morte, ela própria, que se espalha qual mancha de crude) e o crescente desejo de um endurecimento “justicialista”, o ódio primário aos “ricos e poderosos”, a xenofobia tão visível também no caso McCann e num certo culpabilizar de Bruxelas pelos males pátrios, o desconforto e a malaise, muito à “Sala do Risco”, de alguns sectores militares com o general Garcia Leandro e o seu OSCOT à cabeça, os “levantamentos populares” autárquicos, as acusações à ASAE de estar a contribuir para a morte de um estilo de vida “dito” nacional como se vender bolas de berlim nas praias em latas de folha sob o sol de 40º definisse algo diferente de subdesenvolvimento, o próprio modelo ideológico e de actuação de um grande número de autarquias, o anseio latente na sociedade por uma presidencialização sul americana do regime (nada a ver com o actual ou anteriores presidentes, sublinhe-se). Por fim, a própria crise estrutural da economia portuguesa, como pano de fundo. É como se de um certo “fascismo” larvar, subliminar por sermos por ele inculcados sem disso nos darmos conta, se instalasse na sociedade portuguesa, em toda a sua “pureza” ideológica de raiz pequeno-burguesa, nascido de uma classe média nivelada por baixo, material e culturalmente, com muita terra ainda debaixo das unhas. De uma geração necessariamente sacrificada à renovação tecnológica e a um novo modelo de desenvolvimento mesmo que soluçantemente aplicado. Uma lógica a que as direcções políticas, elas próprias, ao contrário da primeira geração do pós 25 de Abril de Soares e Cunhal, Sá Carneiro ou Freitas do Amaral, geradas pela mesma estrutura, não conseguem escapar e da qual se vêm mesmo tornando elemento catalizador, prisioneiras da lógica eleitoral do curto prazo. Prisioneiras de si próprias... a si acorrentando o país.
Nota final: já por aqui tenho por vezes criticado politicamente Manuel Ferreira Leite. Nada retiro do que disse. Mas é de justiça sublinhar que algumas das suas atitudes, como a ausência da Festa do Pontal, parecem querer indiciar uma certa recusa à lógica populista em parte reflectida no que acima se afirma. Veremos, mas é indiscutivelmente um sinal positivo.
Nota final 2: Que desse por isso, apenas na blogosfera se fizeram ouvir vizes críticas à actuação da PSP no BES de Campolide. Por isso, uma saudação muito especial ao "Arrastão", "Blasfémias" e "Insurgente".

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