terça-feira, maio 27, 2008

Quatro (boas) razões para o Estado não baixar o ISP

  1. Baixar o ISP (Imposto Sobre os Produtos Petrolíferos) seria, numa conjuntura em que a consolidação das contas públicas é ainda insuficiente - e agora mais ameaçada pelo menor crescimento económico - e a situação deficitária se mantém, transmitir ao país um sinal inadequado. Mais ainda, ele não deixaria de ser invariavelmente seguido de uma série de reivindicações do mesmo sinal vindas de outros sectores da sociedade. Como se tem provado – por exemplo, Luís Campos e Cunha escreveu não há muito tempo sobre o assunto no “Público” - em Portugal a carga fiscal está longe de ser um elemento essencial na competitividade do país, suplantado por questões como a justiça, burocracia etc. Acresce que uma boa parte do investimento estrangeiro negoceia as suas condições fiscais, e outras, digamos que “caso a caso”. Quer se queira quer não, a consolidação das contas públicas é um elemento essencial e condição sine qua non para o desenvolvimento sustentado do país e, portanto, este deve ser o seu objectivo principal sem recuos, hesitações ou dúvidas injustificadas.
  2. Os combustíveis são um exemplo típico de um produto com elevada rigidez da procura, isto é, cuja procura pouco ou nada reage, dentro de limites relativamente amplos, às alterações do preço. Isto significa que não só a diminuição da receita fiscal gerada pelos recentes aumentos não será tão elevada como se diz por aí, como é duvidoso que uma diminuição da ISP, em valores necessariamente não muito elevados e num contexto em que essa variação negativa seria rapidamente “comida” pelo aumento dos preços-base, trouxesse consigo um proporcional (ou quase-proporcional) aumento da procura, com os seus reflexos na respectiva receita fiscal. Mas... façam-se as contas, e veremos a que conclusões se chega. Nada como comparar números, mas não me parece que a conclusão pudesse ser muito favorável aos arautos da baixa do ISP.
  3. Por outro lado, nem tudo o que é negativo neste contexto. Um aumento significativo dos custos com a energia obriga necessariamente a melhores eficiências, tanto no consumo desses mesmos combustíveis como em outras áreas em que a racionalização de custos o permita compensar. Isto tanto a nível das famílias (menos carro, mais transporte público; menos desperdício em casa; racionalização e partilha das deslocações) como das empresas (busca de oportunidades para redução de custos nos processos produtivos, menos viagens, enfim, maior eficiência). Algo que deve sempre nortear cidadãos e empresas é que é sempre possível fazer ou produzir o mesmo a um menor custo. Existem mesmo empresas que premeiam anual e especificamente esse objectivo.
  4. Por último, existe uma questão mais estritamente política, relacionada com a intervenção do Estado na economia num país em que tudo dele demasiado depende. Intervir neste sentido e nesta conjuntura seria, indiscutivelmente, um sinal dado no sentido da regressão e não do progresso, podendo, e devendo, isso sim, o Estado contribuir para minorar as consequências negativas da actual situação através de uma intervenção ao nível das prestações sociais, das transferências para as famílias que desse apoio mais necessitem e da penalização do desperdício. Esse sim, será um sinal dado no sentido correcto e aí parece-me que haverá ainda muito mais a fazer para além do congelamento do preço dos passes sociais.

Sem comentários: