domingo, maio 11, 2008

Apito...

O “Gato Maltês” volta ao texto e à actividade normal com dois posts sobre futebol, já que estamos num fim de semana de grandes decisões e muito de aparentemente importante se passou nos últimos dias. Pois vamos lá ao primeiro.

Terá algo de muito importante mudado no futebol português com o desfecho do caso que passará para a posteridade com o nome de “Apito Final”? I’m afraid not... Tentarei justificar os porquês, avisando desde já que, não sendo jurista, o faço, portanto, de um ponto de vista não técnico e apenas de cidadão interessado.

Em primeiro lugar pelo óbvio: excepto no caso de Augusto Duarte, as sentenças são demasiado leves, para não dizer inócuas, o que significa não estar preenchida uma das condições-base da sua eficácia: serem suficientemente dissuasoras e evitarem que o crime compense. Mesmo no caso do Boavista, a descida de divisão constitui um problema bem pequeno face à situação do clube (é falacioso invocar a dificuldade acrescida que isso coloca à angariação de investidores, pois, como ficou provado com o lamentável caso Sérgio Silva, que só demonstra o desespero, eles pura e simplesmente não existem) e a suspensão de Pinto da Costa chega quando o seu modelo de gestão está gasto e já se perfilam candidatos credíveis (Rui Moreira) à sua sucessão. Para este, é um pequeno empurrão providencial, pese embora os seus beijos de morte a Pinto da Costa que têm já o valor de elogio fúnebre. Contra argumentarão que existe, de facto, uma sanção moral e que ficou provada a corrupção existente. Fraca consolação, numa área, numa indústria e com agentes em que a moral ocupa um lugar demasiado subalterno na hierarquia das preocupações, podendo o único resultado das condenações ser apenas, isso sim, o de provocar um ainda maior afastamento dos espectadores do espectáculo, face à sua crescente descredibilização, que é presente, e à incerteza da sua credibilização, que será ou não futuro. Claro que, muito possivelmente, são as possíveis em função da legislação existente, mas esse é exactamente um dos problemas: sendo a legislação produzida pelos dirigentes, que na sua esmagadora maioria se mantêm, nada nos diz que possa ser alterada no sentido de uma maior equidade, podendo inclusivamente as actuais sentenças servirem, isso sim, para alertar para os perigos a que clubes e dirigentes se podem expor. A tibieza das reacções à questão dos ordenados em atraso, mesmo da parte de Hermínio Loureiro (a questão não é não poderem inscrever-se na Liga ou perderem pontos no caso de ordenados em atraso – a perda de pontos pode causar prejuízos ou provocar benefícios a terceiros -, é apresentarem garantias reais de que isso não aconteça), não augura nada de muito positivo.

Em segundo lugar porque tudo é demasiado tardio, demasiado à posteriori. Sejamos claros: os acontecimentos que deram lugar à punição aplicada ao FCP e ao seu presidente, por quase desnecessários na altura, só se explicam por um way of doing the things, uma cultura de clube instalada desde há muito e, como acontece com todas as tradições e práticas de longa data, difícil de alterar. Muito mais quando a impunidade de anos a fio tornava o FCP inimputável. A superioridade do clube era já um dado adquirido por essa altura e esses tempos, vinda dos anos em que uma conjuntura política, social e económica favorável permitiu que passasse incólume muito mais e muitíssimo mais grave do que aquilo que agora é condenado, ajudando a vencer a inércia criada por anos a fio de ausência de vitórias e de sucessos escassos. Digamos que o clube cresceu numa mentira para se poder agora afirmar numa verdade: a sua actual e incontestada superioridade desportiva.

A questão agora será: é possível que tudo mude para que eventuais situações semelhantes possam ser detectadas em tempo suficientemente útil para que o prevaricador delas não beneficie? E que a legislação permita a aplicação de penas verdadeiramente dissuasoras? Com a maioria dos actuais dirigentes, criados pelo actual “sistema” e que dele vivem e se alimentam (sem mesmo saberem como sobreviver fora dele), isso parece-me impossível, e apenas a sua substituição o poderá tornar viável. Parece-me que só um ainda maior declínio da indústria, fruto da sua incompetência dirigente, ou um mercado mais competitivo, por via de uma maior internacionalização (a ideia de uma Taça da Liga Ibérica, na impossibilidade da fusão dos campeonatos ibéricos, a solução ideal, parece-me muito positiva), poderá conduzir a esse desiderato. Sem isso, receio bem estarmos apenas perante pequenos face liftings, pequenas operações de cosmética.

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